Todo o maestro é grosseiro?

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Seu regente é grosseiro? Você acredita que isso seja reflexo de sua competência? Hoje vamos falar sobre uma polêmica antiga. Todo maestro é grosseiro? Veja a seguir:

Autoridade e Competência

Um dos recursos mais utilizados para o artista alcançar  sucesso é a criação de polêmicas para chamar a atenção. No caso do maestro, estas polêmicas estão mais relacionadas às questões de liderança e autoridade. Alguns maestros, para se destacarem, criam personagens próprios, muitas vezes excêntricos, cuja característica principal, em muitos casos, é a rispidez.
Muitas pessoas esperam do maestro eficiência nos empreendimentos, tratando-os como artistas empreendedores, que inspiram os outros a realizar tarefas musicais. No entanto, nessa missão de ter autoridade sobre o outro, muitos maestros escolhem ser grosseiros e, alguns músicos e cantores, inclusive, concordam que esta deve ser uma característica necessária para a profissão. Essa aspereza, muitas vezes, é uma autoproteção, onde o regente, na sua grosseria, não dá margem para seus liderados se posicionarem.
Alguns regentes, inclusive, ocupam posições cuja estabilidade é tão grande que quase se sentem deuses diante de seus geridos. Um professor de universidade pública, por exemplo, é uma dessas situações. Nessas posições, a imunidade se torna mais ampla, pois dificilmente serão despedidos por uma grosseria aqui ou ali.

Mercado

O mercado me mostrou que essa posição não traz benefício ao maestro, pois o cantor/músico é maioria em um grupo, e, se organizando, pode retirar o maestro facilmente de seu posto. Podemos dizer seguramente que o maestro está longe de ser o dono de um coro ou de uma orquestra. Os donos são os próprios integrantes, e os chefes das instituições que bancam o empreendimento.
No fim das contas, quem tem o poder é aquele que paga as contas. Se forem cantores de coro, são eles que mandam, se for uma instituição, o(s) dono(s) que manda(m). O maestro é uma pessoa que está a serviço deles. E essa é a posição ideal de um líder. Estar a serviço dos desejos de um todo. 
Antigamente, a figura autoritária e imponente era vista como competente, mas, hoje em dia, esta postura está cada vez mais distante. O mercado exige líderes competentes e acessíveis; que sejam humanos e despertem o melhor do outro, sem traumas e desavenças. Embora ainda hajam muitos maestros que adotam uma postura grosseira, a tendência é que desapareçam, conforme as pessoas ficam mais conscientes e o mercado mais especializado.

Da regressão à responsabilidade

Freud possui um conceito denominado regressão. Uma das características desse conceito consiste em voltar ao estágio infantil nos momentos de frustração. Muitos consideram determinados "pitis" como aspectos da regressão. Encaram como se o maestro estivesse agindo de maneira infantil, fazendo pirraça por não conseguir alguma coisa. Embora este conceito esteja ultrapassado na psicanálise moderna, podemos fazer algumas reflexões.
Pelo olhar de Freud, tanto maestros como cantores e músicos podem ter momentos de regressão, revelando imaturidade de ambos os lados, ao lidar com situações difíceis. Ambos podem se descontrolar e agir de maneira infantil.
Ainda bem que o conceito de regressão está ultrapassado, pois, de fato, se o coro não for infantil, ninguém é criança naquele trabalho e, nem a regressão trará de volta uma criança pirracenta adormecida. Na verdade, são adultos que ainda não aprenderam a lidar com os próprios reveses.
Adultos musicalmente imaturos, assim como líderes imaturos, podem revelar posturas agressivas, obsessivas, paranoicas. Podem demonstrar aspectos bem complexos da psicologia que tanto um maestro, como seus liderados, não saberão lidar sem a orientação  de um profissional da área.
O grupo pode agir de diversas maneiras ao lidar com pessoas cuja postura é inapropriada. Podem tratá-las, como o "café com leite", não dando nenhuma atenção ao que dizem, fingindo não existirem. Essa postura, inclusive, pode partir do maestro que, em determinados casos, passa a ignorar as arguições que partem de determinados agentes. Nos dias de hoje, nem as crianças são tratadas com tamanho desdém.
Na verdade, o que normalmente acontece, é a falta de responsabilidade. Muitos cantores, por não assumirem as necessidades do coral, por exemplo, inventam todo tipo de desculpa para disfarçar o fato de não terem estudado para o ensaio, de não frequentar aulas de leitura musical, de não estarem dispostos a aprender mais sobre música. A imaturidade musical, muitas vezes, traz posturas perniciosas para o ensaio  que, amiúde, tiram o maestro do sério.
Daí, é necessário utilizar a conscientização como ferramenta de coerção. Se um grupo se propõe a solfejar, o cantor que não solfeja será um "peixe fora d'água". Se um grupo adota a leitura como procedimento padrão, os agentes que não leem ficam deslocados. Ou seja, cada grupo possui normas de conduta, que podem ser formais ou informais, mas que a maioria dos integrantes deve seguir, garantindo o equilíbrio do conjunto. Aqueles que não seguem, além de desarmonizar o ambiente, são tratados com indiferença, viram "café com leite".
O bom líder é aquele que sabe lidar com os aspectos ligados à responsabilidade de forma inteligente, mostrando ao cantor/músico que, seguindo caminhos inadequados, age de forma infantil e se desloca do grupo. O bom liderado é aquele que tem clara a sua função diante dos objetivos, e sabe como executar a sua parte para tal. Cabe ao maestro manter o caminho planejado para dar certo, permitindo alguns desvios apenas para ajuste, conscientizando aqueles que não se adequam. Sendo, de vez em quando, duro, pois muitos não se “mancam” com facilidade.

Autoridade e Insegurança

Conforme o maestro amadurece, percebe que as grosserias estão mais ligadas às suas próprias inseguranças. Não conseguir realizar determinada tarefa gera uma frustração e, os que não sabem lidar bem com isso, terminam dando broncas nos músicos sem sentido e sem objetivo. Broncas que dificilmente surtirão efeito, se não forem bem usadas. Não estou dizendo que um puxão de orelha não deva ser dado de vez em quando, mas precisa vir de maneira consciente e fazer sentido para o grupo, do contrário, será um mero "ataque de pelanca".
De qualquer forma, é necessário observar o que traz essa insegurança ao maestro para que não consiga encontrar outra solução senão a repreensão. Sendo um administrador de pessoas, muitas situações passam longe da competência musical, mas são de ordem administrativa, e é aí que o conjunto pode estar falhando.

Os p's da liderança

Phillip Kotler é um difusor do conceito de p's para o marketing. Os 4 p's (produto, preço, praça e promoção) são objeto de estudo para muitos estudantes de administração. Sua ideia penetrou tanto as graduações que, hoje em dia, possui diversas variantes que aprofundam os conceitos, e criam outros ligados às situações contemporâneas.
No programa de TV "O Sócio", apresentado por Marcus Lemonis, é possível encontrar uma variante deste conceito com os 3 p's da liderança: "produto", "pessoas" e "processo". Para Lemonis, esses p's são os pilares da liderança administrativa e, qualquer falha em qualquer um desses quesitos, pode levar uma empresa à falência.
Podemos observar a preparação de um repertório, um show, um concerto, sob a ótica dos 3 p's, sendo o próprio concerto/apresentação/gravação ou qualquer outro tipo de resultado musical final o produto, as pessoas que atuam nele, seus agentes e o processo, a maneira como chegam ao resultado previsto.
Portanto, sob a ótica dos 3 p's, o trabalho do maestro é usar as pessoas para criar um produto musical. Para isso, terá de usar os processos adequados de acordo com o perfil do grupo que conduz e o desejo de seus integrantes. No fim, assim como qualquer empresa, o regente administra pessoas. Por isso, os momentos de repreensão podem estar ligados a processos que não estão sendo seguidos. Daí, não considero que a bronca ocorra por regressão. Como é muito frustrante planejar um empreendimento inteiro e seus agentes não cumprirem seu papel, é perfeitamente aceitável uma atitude repressiva, para que o processo seja seguido. 
Sendo o processo um fator primordial para o sucesso do trabalho, cabe ao regente implantá-lo a qualquer custo. Por isso, é obrigado a agir como o chefe de um setor administrativo que percebe que os procedimentos padrões de qualidade da empresa não estão sendo seguidos, e sabe que isso afeta o produto final.

As vítimas

Uma das atitudes mais comuns é se fazer de vítima e inventar todo o tipo de desculpa por não ter seguido o processo dado pelo líder. É comum cantores de coro dizerem que não estudaram porque deu defeito no instrumento, no celular, que o universo não conspira a favor, que não possuem talento para a coisa, etc. No final das contas, quando alguém não faz sua parte, o problema é esse alguém. Cabe ao maestro repreender para educar, pois a atitude é inadequada.
Se o processo está claro, o maestro é acessível, todos os agentes seguem, menos um ou outro, a repreensão se faz necessária. Haverá aquele que se faz de coitado e diz que o maestro é "grosseiro", mas, na verdade, está dando apenas mais uma desculpa por não fazer sua parte.
Somente configura grosseria se a repreensão for ofensiva e/ou violenta, do contrário, é apenas uma medida educativa. É função do líder repreender quem está errado. Um maestro não pode ser agradável o tempo todo, especialmente quando as coisas não estão indo da maneira que deveriam. Cada grupo tem uma proposta que norteará os seus processos definidos de acordo com a competência do maestro e dos agentes. A repreensão saudável deve ser respeitosa e buscar a conscientização de um bem comum. 

Treinamento

Cada grupo tem uma proposta que norteará os seus processos, que, por sua vez, são definidos de acordo com a competência do maestro e dos agentes. A questão é "como" esses talentos serão aproveitados para atingir o resultado desejado. Caso o problema seja falta de talento, o maestro terá de criar ferramentas que resolvam isso, como cursos de especialização, intercâmbios, etc.
Da mesma forma que uma empresa investe em treinamento para melhora de pessoal, um regente deve investir em treinar seu grupo para uma melhor performance. Obviamente, o grupo precisa querer ser treinado. Isso vai depender muito de cada realidade, e da proposta de cada grupo. Se a proposta é ser melhor, o treinamento se faz necessário. Se um ou outro agente não se propõe a melhorar, está afetando o processo de todo o conjunto, logo, está alheio à necessidade e será passível da repreensão do chefe.
Cada proposta de grupo possui uma exigência técnica. Assim como qualquer empresa, os integrantes precisam estar preparados para tal. Caso não estejam, é necessário investir em treinamento e observar se está sendo eficiente.

Treino e treinador

É importante que o estudante de música observe se os objetivos estão sendo alcançados em seu treinamento.
Observe quanto tempo você treina durante a semana e veja se isto condiz com a sua realidade. Se houver pouco treino, consequentemente, terá pouca produtividade, se houver muito treino, o contrário.
Além disso, observe se o seu treinador compreende os objetivos de seu trabalho. Veja se, com a ajuda dele, os processos acontecem com mais facilidade. Caso contrário, pense seriamente em trocar de treinador.
Em termos práticos, para o canto coral, observe se aquele agudo que o maestro pede para dar possui qualidade, se seu solfejo está independente, se sua colocação vocal condiz com o timbre proposto para o coro.
Se você é dedicado no treinamento, mas, mesmo assim, não alcança os objetivos propostos, talvez o problema seja o seu treinador. O trabalho dele pode estar afetando o processo, logo, pode levar o empreendimento ao fracasso.

Na próxima postagem trarei algumas situações de canto coral que deixam o maestro uma "arara". Inscreva-se no blog e siga nas redes sociais para ser notificado.

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